sexta-feira, 8 de agosto de 2014

lies' lover



               

                Apercebi-me que deixei de te sentir quando atravessava a estrada e não te via em todos os rostos que me fitavam. Quando os nossos olhares se cruzavam, todos eles me contavam uma história: mas nenhuma delas era a nossa. Umas eram mais bonitas que outras, outras um pouco patéticas mas, do seu jeito, românticas.
A rotina tomou conta de mim. Os pensamentos vagueavam por ruas com placas a que eu não sabia dar o correto significado, o coração havia sido cosido pelas meigas mãos do tempo e, sem dar por isso, um dia adormeci sem te ter no meu pensamento. Só hoje dei conta disso. Mas questiono-me: será que os nossos palpitares cardíacos ainda estão em sintonia, ou já andamos a seguir pautas com diferentes notas musicais?
Quando vou ao jardim, são muitas as pessoas que vou observando. Estranhos que não me conhecem, e aos quais não sou capaz de transmitir a minha, tua e nossa história. Mas gostava. Assim seria capaz de a deitar para fora de mim e, de certa forma, esquecê-la. Deixámos de ser metades de uma única peça de puzzle quando deixei de esperar encontrar-te lá, sentado exatamente no ponto central do relvado, quando ouvia e sentia o som de uma harmónica. O que antes era o estímulo principal para me levar a esquecer a saia rodada e a correr por ali fora para poder cair nos teus braços, agora não é nada. As veias já não vibram, as pernas já não querem movimentar-se alternada e freneticamente, o meu órgão pensador não anseia pela tua imagem. Passo rapidamente pelo rapaz desconhecido e de pernas cruzadas, com livros aos quais não quero sequer conhecer o título e ignoro a sua presença.
Quando nos esquecemos de esquecer, é quando se esvai. As emoções ficam enterradas no ente, e nem um apocalipse é capaz de as reaver. Mas… Não há acontecimentos mais fortes que o mundo a abanar, vulcões a explodir, o Sol a encontrar-se com a Lua, a ressurreição de Romeu e Julieta e um Hitler versão 2.0?
Há.
Quando nos apercebemos que, se calhar, andamos a tentar enganar-nos a nós próprios. E essa é a pior traição que pode existir.

Sem comentários:

Enviar um comentário