segunda-feira, 31 de agosto de 2009

ficção


Gostava que pudesses morar ao meu lado sem saberes da minha existência. Poder ver da janela do meu quarto a luz do teu desligar-se, e assim saber que ias dormir, que ias partir para outro mundo por umas horas. Podia acompanhar-te. Podia todas as manhãs ver-te sentado à varanda a olhar o sol – os teus olhos brilhavam sempre, brilhavam muito - , ver-te cortar a relva, ver-te andar de bicicleta a dar voltas e voltas num mesmo círculo. Podia saber quando saías, quando voltavas, quanto tempo demoravas. Podia ver onde estavas de vez em quando, tudo apenas da janela do meu quarto. Apenas saber como era a tua vida me bastava. Não fazer parte dela? Importava-me, mas nunca tinha havido oportunidade de me encaixar na tua rotina, passo o dia a olhar pela janela para saber onde andas, como estás. Às vezes vejo-te chorar, não sei porquê, mas sei que te dói muito o coração. Sei que és lindo por dentro sem nunca ter falado contigo, sei quando estás feliz, sei quando estás angustiado. Conheço-te melhor do que ninguém, e tu não o sabes. Sabes que vive uma menina na casa da frente mas não sabes como se chama, não sabes de que família é, não sabes a sua idade, não sabes nada de nada sobre ela.
Os sonhos passaram a realidades mais que veridicas, e à uns dias que te vejo rondar o meu lar, parece que a curiosidade despertou em ti, pois nunca vês ninguém cá fora, mas sabes que vive aqui gente. Vês o meu pai a ir buscar o pão, vês a minha mãe sair para fazer compras, mas nunca me vês no jardim. Nunca me olhaste. Sou só, estou sempre no meu quarto – o meu refúgio. E tu estás assim, a tentar encontrar-me, sem eu poder mostrar-me. Escondo-me também, não quero nunca que me vejas, gosto do mistério. Sei que se algum dia me vires eu serei invisível aos teus olhos, pois os teus olhos apenas vêm a pureza, e eu já cometi erros inexplicáveis, e o que tu tanto queres ver, nunca verás. Podia até sair de casa e mostrar-me bem à tua frente que não me verias. Eu amo-te em silêncio, pois as minhas palavras são caladas pelo som do erro e a minha respiração ao lado do teu pescoço seria abafada pelas correntes que nos separam. Podia segurar-te na mão com todas as forças que pudesse, mas tu não sentirias. Um dia estava à janela a olhar-te a rondar a minha casa, olhaste para mim, mas eu sabia que não me vias, mas mesmo assim… continuaste a olhar. Foste bater à porta, chamaste por alguém da casa, mas ninguém te abriu a porta. Algo mudou, podias-me ver, mas eu não queria entrar na tua vida, apesar de já o ter feito sem intenção, por mero acaso. Mas não te queria fazer sofrer, por isso não me verás mais, não saberás mais nada de mim. Vou-me esconder dos teus olhos e afundar-me no meu mar de medos e receios. Embrulhar-me-ei em lençóis de infelicidade e fechar-me-ei entre correntes do desespero. Parte de mim deseja que me vejas, mas a outra parte sabe bem que não podes. Por isso nunca mais colocarás os teus olhos sobre a minha pele, pois a tua segurança e felicidade depende de mim, e das minhas escolhas em relação a entrar na tua vida por vontade própria. Escrevia-te uma carta, mas assim saberias que queria contactar-te, que me preocupava. Portanto, adeus, fechei-me como uma concha.

Obsessão por ti? Não. Obsessão pela tua felicidade, obsessão pela tua vida.

SONHOS TORNADOS REALIDADE, E REALIDADES QUE SÃO APENAS SONHOS

sábado, 15 de agosto de 2009

the most important?


Todos os passos que damos constroem o nosso futuro e o nosso dia-a-dia. Durante esse caminho adornado por pedras, pontes, cordas, flores que fazem com que a vida não seja apenas uma linha recta conhecemos novas pessoas que vão-nos marcar e vão fazer parte da nossa vida, e outras que apenas estão de passagem ou que nos tocam no ombro ao caminharem do lado contrário ao nosso. Vamo-nos conhecendo a nós próprios e descobrindo o porquê das pedras e das pontes existirem. Toda a vida tem um porquê, tem razões. Todos nós queremos ser algo ou alguém, e vamos aprendendo ao longo da nossa caminhada, sem direcção conhecida, mas sempre sempre com alguém de mão dada à nossa. A minha vida tem os membros da família mais importantes, os amigos mais importantes, as músicas mais importantes, os momentos mais importantes, os locais mais importantes, as falas que foram para nós mais importantes - todas essas coisas contribuíram para a direcção a que hoje seguimos. Eu já tive a pessoa mais importante na minha vida, já tive, digo bem. Agora continua a ser importante claro, mas já foi mesmo o mais importante, que se encontrava acima de tudo e de todos. Mas numa encruzilhada seguimos direcções diferentes e separámo-nos. Não tenho bem a certeza se foste feliz comigo, mas creio que sim. Para conseguirmos prosseguir temos de ter propostas, fazer escolhas, e ter oportunidades. Ultimamente a vida tem-me dado algumas oportunidades, mas todas elas com um senão, todas elas com uma nódoa negra pelo meio. Não, assim não consigo ser feliz, mas isso é um aparte. A ti a vida deu-te uma oportunidade de ouro, aceitaste-a e fizeste bem. Todos nós temos direito a ser felizes, não é? Quer seja com que seja. Ainda mais porque eu sei que a tua oportunidade foi merecida, das duas partes, e porque confio em quem agora cuida de ti, confio mesmo.
Existe um papagaio que me puxa sempre a frente, deixa-se ir pelo vento e quer fazer o mesmo comigo, não quer que me prenda ao passado e às minhas memórias, quer que eu olhe pelo meu futuro e quer que eu me alegre mais. Sei que um outro dia qualquer também hei-de ter a minha própria oportunidade pois o meu papagaio não se engana, ele apenas quer o meu bem. Salto por cima de pedras, colho flores, atravesso pontes com suaves abanões do vento e sem olhar para baixo e agarro nas cordas com toda a força para conseguir passar por cima de leões, cobras e o furioso rio, para assim passar para o outro lado do abismo e seguir sem setas, sem tabuletas, sem mapa. Um dia hei-de receber um abraço de alguém que me conhecerá. Secalhar até já conhece, não sei, ainda não veio ao de cima e eu não consigo ver. Ouço silêncio e vejo tudo preto. O saco está vazio e só existem migalhas sem valor algum. Um dia vou receber um abraço que me vai fazer dizer a mim própria "obrigada pela oportunidade, obrigada". Mas enquanto isso não acontecer, limito-me ao que agora é mais importante, ao que me agarro com todas as forças para me fazer respirar, para me fazer viver.
Estou bem assim, mas quero ser mais, quero um maior brilho, quero sentir mais entusiasmo, quero-me sentir amada, quero sentir-me realizada. Quero novamente aquelas expressões que o mais importante me fazia ter, quero sorrir daquela maneira, quero sentir o que senti, quero estar como estive todos aqueles dias. Quero felicidade pura.
just breathe

terça-feira, 11 de agosto de 2009


Nada me parece possível quando opto pela linha de comboio. Percorro-a saltando de tábua em tábua, olhando a natureza que parece ser impossível, sentindo o cheiro a malmequeres que ainda se vêm entre as silvas. Não ouço nada a não ser o chilrear dos pássaros e os grilos. Gosto tanto de ouvir os grilos, são umas criaturas tão magníficas, têm um som maravilhoso que faz-me derreter dos pés à cabeça, é mágico. Não consigo pensar noutra coisa se não no que estou a sentir. Sinto-me algo diferente, mais normal que antes. Estou bem a percorrer esta linha, sei que um dia chego à paragem a que tenho de sair sem ter que apanhar o comboio. Mas as suas rodas são mais rápidas que os meus passos, e como eu não o quero apanhar – não quero ser apressada, as coisas levam o tempo necessário para serem feitas – ele apanha-me a mim. A minha inocência leva-me às portas do outro mundo, e sem querer, saio dali a voar. Apenas queria continuar aquela sensação, como quem se senta na ponta de um banco a chorar e alguém nos olha e vai-nos dar o seu ombro, é tão bom sentir alguém preocupado connosco. Mas acabou, fiquei nos carris, com os meus sonhos completamente esmagados, com a alma devastada em pó. A última coisa que queria era ser apanhada de surpresa pelo destino que corre mais depressa que o vento, mas aconteceu. Os sonhos foram para dentro de uma caixa junto de muitos outros, e eu continuei a caminhar, noutro lugar qualquer, por uma terra qualquer, num mundo qualquer a que ninguém tem acesso. Um mundo meu, em que todos estão mas também não estão. São completamente invisíveis aos meus olhos, continuam os seus caminhos sós, e apesar de sós, continuam felizes. Tal como eu: feliz. Não a pensava alcançar desta maneira, mas quem manda em nós lá sabe o que será. Ando junto do mar, passeio pelo meu jardim, colho flores, escrevo, leio e rio. As minhas gargalhadas ouvem-se em todo mundo, e eu consigo ouvir as gargalhadas das outras pessoas sem as ver. Só mesmo para transmitir a felicidade geral que este mundo nos proporciona. Seremos sempre felizes, depois do fim, e antes do recomeçar, seremos sempre, temos apenas de encontrar o nosso caminho, seja ele a linha de comboio, a beira-mar, uma ponte, um raio de sol, a sombra. Apenas seguiremos o nosso instinto juntamente do nosso coração, eles irão-nos guiar pela direcção certa, sempre. Não se enganam, e dão-nos pistas para termos sempre a vida que merecemos, apenas temos de acreditar que sim, o nosso futuro existe, já está programado, apesar de acharmos que somos nós que o programamos. Já temos um lugar para nós ao longe, ao sol, no quentinho, no bem-estar. Mas eu imaginava-te de mãos dadas comigo ao meu lado naquela linha de comboio que fez com que tudo mudasse. Contigo sabia que me sentiria em segurança, que me protegerias para sempre, que me salvarias do mal que me pudesse acontecer, que te atiravas para o meio da linha para assim morreres na minha vez. Mas as escolhas foram feitas pelo nosso Pai e ele decidiu assim. Mas mesmo assim, eu sabia isso tudo porque tu és o cuco do meu relógio – a minha razão de acordar. Sei que vais estar sempre a meu lado doutra maneira, pelo pensamento, e que nunca me vais deixar, porque gostas de mim, sou importante para ti, sei-o bem, e também és importante para mim. Mas na realidade, só queria que me visses agora, a forma como me rio, como olho para as pessoas, a forma como segui em frente sem ser preciso me amares, só queria que visses tudo isso, pois eu sabia que te orgulharias da forma como progredi sem teres de colocar o teu dedo duma forma diferente da que agora colocas na minha vida. Pelo menos deste-me a oportunidade de poder continuar abraçada ao teu coração.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

meu protector.


Todas as manhãs saia da minha casa arrastando a rede de peixe que servia de porta e olhava para o meu orgulho. O mar. Eu vivia à frente do mar, e todas as noites adormecia enquanto o som das ondas me embalava, e sonhava aconchegada ao seu cheiro a sal. Era como se fosse meu pai, sempre presente para me ajudar, sempre lá quando eu chorava – chorava a sua água, eram lágrimas salgadas, estava lá para me ouvir nos dias em que eu não aguentava viver mais. Sempre que saia com o meu barco – o esquecimento – sentia-me livre, sentia que podia ir para o meio do oceano e contar a todos os seres o que sentia, e estes compreendiam-me. Sentia-me vazia, como quando acordamos mais cedo e vamos ver se o padeiro já trouxe o pão, e o saco está vazio. Navegava com todas as minhas forças, ia para longe, podia sair de manhã cedo e apenas voltar no dia seguinte, mas pelo menos voltava feliz e não iria transmitir as minhas sensações mais escuras para as pessoas que em casa me esperavam preocupadas, apesar de estarem habituados a estas minhas saídas com o mar, o meu companheiro, meu pai, meu protector. Numa noite de Agosto em que estava muito calor e eu não consegui descansar os meus olhos sentei-me no parapeito da janela e olhei o horizonte. Estava cor-de-laranja, apesar de já ser bastante tarde. Mas era sempre assim, o sol pousava tarde, deixando os raios entrarem pelas persianas pela última vez no dia e nos darem um ar carinhoso, como quem nos dá as boas noites. Nessa noite apetecia-me realmente dormir, mas não conseguia, era-me impossível. Sentia-me pior que nos outros dias, e o calor acentuava a situação. Parecia que começava a alucinar, e vi-te. Vi ao longe um barco com um homem, tinha os seus cabelos ao vento e estava na ponta do seu barco. Tentei ver o nome do barco, e não era um nome normal. Fui buscar os meus binóculos, e quando voltei já não vi barco nenhum. Tinha desaparecido como quando um rato corre para o seu buraco, para o seu aconchego, longe do gato que o amedrontava. Fiquei tonta. Tive um flash e isso não era normal. Tinha sido tudo fruto da minha cabeça. Sentei-me na cama e adormeci, como a bela adormecida. Sentia que não iria acordar mais, dando lugar à areia, espinhos. E sentia-me apavorada por dentro, vi um alguém desconhecido que me despertou atenção, e fez-me ter sonhos estranhos, em que não sentia o vazio enquanto dormia. Quando acordei suava por todos os lados, não sabia o que me tinha acontecido. A cama parecia que tinha acabado de chegar da guerra, devo-me ter mexido tanto durante a noite que devo ter acordado quem dormia abaixo de mim. Eram 6 da manhã e eu não aguentei mais, vesti a minha gabardine, pus a trela à minha cadela que me acompanha sempre quando viajo de barco, a Lucky e saí de casa a correr em direcção ao mar. Tropecei numa rocha e caí de cara na areia, enquanto o mar me puxava para si. Eu só queria fugir dali, queria ter a sensação que tive de novo. Adormeci de novo. Acordei com o latido da Lucky sobre os meus ouvidos, ela estava ao meu lado a tentar aquecer-me e a tentar puxar-me para o mais longe possível da beira-mar. Estava encharcada, mas nem isso fez-me parar. Apesar de não estar em condições, armei-me em louca e fui a correr até ao esquecimento. Eu queria navegar, e tinha a certeza que aquilo não era uma miragem que passou perante os meus olhos para me atormentar. Eu não merecia isso. Só tentava mudar tudo, só tentava não me sentir tão vazia preenchendo o tempo a contar histórias ao mar, a mergulhar nele, a dedicar-me a ele. Mas apesar do meu amor, não era suficiente. Precisava de alguém de carne e osso que me ajudasse. Ouvi trovões, e senti a chuva nos meus cabelos. Isto não era bom. A Lucky começou a ladrar e barco começou a baloiçar no mar enquanto começou a chover fortemente. Eu tentava acalmar o barco mas este movia-se como quando um bebé empurra o seu patinho na banheira para baixo, para vê-lo subir e mexer-se de um lado para o outro, até parar. Enquanto tentava manobrar o barco escorreguei e caí de joelhos. Não evitei, e deixei-me chorar e gritar ao meu protector porque me estava a fazer isto, porquê. Estava a enlouquecer, só queria ter uma vida serena. Não era pedir muito, pois não? Abri os olhos e ao longe vi um barco que se aproximava de mim. Esfreguei-os para ter a certeza de que não era um sonho, e vi o homem outra vez, com os seus cabelos ao vento a olhar para mim e a controlar o seu barco para chegar até cá. Nos escassos e longos segundos que se sucederam, li o que estava escrito no barco “LUA CHEIA”, era o seu nome. De repente senti uma terna paz dentro de mim, e um longo silêncio. Quando acordei a primeira coisa que vi foram os seus olhos castanhos a brilharem ao verem os meus. Eram tão lindos, tão puros, tão perfeitos. Ouvi-te: Está bem? Mas apenas consegui dizer: Lua cheia. E adormeci outra vez. Nos meus sonhos continuava a ver aquele homem que não sabia o nome, mas que agora sabia que amava. Que por magia amava, sem saber nada dele. Apenas por ter estado no momento certo, no sítio certo. De repente dei um salto da cama porque não sabia o que realmente se tinha passado. E ele disse-me que o meu barco virou e eu desmaiei. Que eu fiquei como por milagre agarrada numa tábua com a minha queria Lucky ao meu lado, sempre a proteger-me. Agradeci-lhe do fundo do meu coração, não lhe poderia pagar de outra maneira. Mas ele disse-me: Pode pagar sim, minha querida. Eu fiquei confusa. Não era possível pagar com dinheiro tal coisa! Não tinha tanto para lhe dar quanto eu gostaria. Mas continuámos no silêncio. Nessa noite levantei-me e percorri o corredor da casa daquele desconhecido até encontrar o seu quarto. Quando abri a porta, vi-o a dormir. Estava vestido, tinha tido demasiado trabalho comigo e adormeceu logo. Olhei-o e reparei nos seus fios de cabelo, pretos e brilhantes, vi a sua pele seca e gasta, como de quem viaja demais e não tem tempo para se hidratar. O seu corpo era forte e perfeito, tal como ele. Perfeito. Deitei-me ao lado dele, e acarinhei-o. Ele abriu os seus olhos e eu disse-lhe: Sou como a lua um dia antes de ser completamente cheia. Pareco feliz quando só estarei completamente feliz no dia seguinte. Desvendaste o meu enigma mais depressa do que eu própria. Amo-te. Obrigada.
Ele respondeu: O meu nome é esperança, e eu amo-te por teres esperado por mim, sem saberes que eu te procurava.
E eu não estava desiludida com o mar, o meu grande protector, pois ele pôs-me em perigo porque sabia que alguém me salvaria, e eu seria feliz por encontrar o pedaço que me tapava o vazio. Ele não me fez ter flashes, fez-me ver que a realidade esperava por mim, mas que eu não conseguia aceder a ela. E por isso, fez tudo por mim. Abraçou-me da melhor maneira que podia, e fê-lo de uma forma que me fez amá-lo ainda mais.