terça-feira, 11 de agosto de 2009


Nada me parece possível quando opto pela linha de comboio. Percorro-a saltando de tábua em tábua, olhando a natureza que parece ser impossível, sentindo o cheiro a malmequeres que ainda se vêm entre as silvas. Não ouço nada a não ser o chilrear dos pássaros e os grilos. Gosto tanto de ouvir os grilos, são umas criaturas tão magníficas, têm um som maravilhoso que faz-me derreter dos pés à cabeça, é mágico. Não consigo pensar noutra coisa se não no que estou a sentir. Sinto-me algo diferente, mais normal que antes. Estou bem a percorrer esta linha, sei que um dia chego à paragem a que tenho de sair sem ter que apanhar o comboio. Mas as suas rodas são mais rápidas que os meus passos, e como eu não o quero apanhar – não quero ser apressada, as coisas levam o tempo necessário para serem feitas – ele apanha-me a mim. A minha inocência leva-me às portas do outro mundo, e sem querer, saio dali a voar. Apenas queria continuar aquela sensação, como quem se senta na ponta de um banco a chorar e alguém nos olha e vai-nos dar o seu ombro, é tão bom sentir alguém preocupado connosco. Mas acabou, fiquei nos carris, com os meus sonhos completamente esmagados, com a alma devastada em pó. A última coisa que queria era ser apanhada de surpresa pelo destino que corre mais depressa que o vento, mas aconteceu. Os sonhos foram para dentro de uma caixa junto de muitos outros, e eu continuei a caminhar, noutro lugar qualquer, por uma terra qualquer, num mundo qualquer a que ninguém tem acesso. Um mundo meu, em que todos estão mas também não estão. São completamente invisíveis aos meus olhos, continuam os seus caminhos sós, e apesar de sós, continuam felizes. Tal como eu: feliz. Não a pensava alcançar desta maneira, mas quem manda em nós lá sabe o que será. Ando junto do mar, passeio pelo meu jardim, colho flores, escrevo, leio e rio. As minhas gargalhadas ouvem-se em todo mundo, e eu consigo ouvir as gargalhadas das outras pessoas sem as ver. Só mesmo para transmitir a felicidade geral que este mundo nos proporciona. Seremos sempre felizes, depois do fim, e antes do recomeçar, seremos sempre, temos apenas de encontrar o nosso caminho, seja ele a linha de comboio, a beira-mar, uma ponte, um raio de sol, a sombra. Apenas seguiremos o nosso instinto juntamente do nosso coração, eles irão-nos guiar pela direcção certa, sempre. Não se enganam, e dão-nos pistas para termos sempre a vida que merecemos, apenas temos de acreditar que sim, o nosso futuro existe, já está programado, apesar de acharmos que somos nós que o programamos. Já temos um lugar para nós ao longe, ao sol, no quentinho, no bem-estar. Mas eu imaginava-te de mãos dadas comigo ao meu lado naquela linha de comboio que fez com que tudo mudasse. Contigo sabia que me sentiria em segurança, que me protegerias para sempre, que me salvarias do mal que me pudesse acontecer, que te atiravas para o meio da linha para assim morreres na minha vez. Mas as escolhas foram feitas pelo nosso Pai e ele decidiu assim. Mas mesmo assim, eu sabia isso tudo porque tu és o cuco do meu relógio – a minha razão de acordar. Sei que vais estar sempre a meu lado doutra maneira, pelo pensamento, e que nunca me vais deixar, porque gostas de mim, sou importante para ti, sei-o bem, e também és importante para mim. Mas na realidade, só queria que me visses agora, a forma como me rio, como olho para as pessoas, a forma como segui em frente sem ser preciso me amares, só queria que visses tudo isso, pois eu sabia que te orgulharias da forma como progredi sem teres de colocar o teu dedo duma forma diferente da que agora colocas na minha vida. Pelo menos deste-me a oportunidade de poder continuar abraçada ao teu coração.

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