segunda-feira, 25 de abril de 2011

poça de lama

Mesmo encostada à cama, com poucas calorias no corpo e sem forças para levantar um dedo sequer, consigo ainda saber que estás mesmo a passar em frente a minha casa. Tenho os olhos fechados, a minha respiração está intermitente mas o pulsar do meu coração é contínuo e meloso. No meio do silêncio sepulcral que se faz nesta divisão que é mais o meu túmulo do que o meu quarto, ouço-te respirares ao mesmo tempo que eu. Estás cansado, e olhas incansavelmente para o meu jardim. Todos os dias que por aqui passas, à mesma hora, e demorando o mesmo tempo, tens o mesmo objectivo: deitar os olhos em mim, num cabelo meu, em algo que me pertença; algo que te faça saber que ainda tenho sangue a viajar por entre as minhas veias.
O quarto já de si é a escuridão total, mas a que exteriorizo do meu coração ainda o torna mais estranho e, de certa forma, aterrorizante. Mas isso não me incomoda. É que se tivesse medo do escuro, teria medo da minha própria alma.

Sei exactamente, com vírgulas e pontos finais incluídos, o que estás a pensar. Numas vezes tens a certeza de que morri e que foi por isso que nunca mais se ouviu falar em mim... Mas todas as noites, incluindo as poucas em que dormes bem porque não intervenho nos teus sonhos, antes de adormeceres, tens também toda a certeza de que estou viva. E, pior de tudo, que ainda me amas.

Hoje é um dos dias em que te sentes decidido a deixar-te ficar mais uns segundos lá à frente, qual estátua de jardim, a ver se ganhas coragem de tocar à campainha. Mas eu conheço-te tão bem que sei que não preciso de me preocupar - nunca o farás. Antes, eras um rapaz repugnante que se deixava mover pela razão e não pensava no que dizia: magoava e não dava por isso. E foi por isso que me vim embora. Tu. Tu és o culpado de eu agora ser tal e qual uma filha das trevas, uma deusa da noite sem asas a adornar as costas, uma zé ninguém que agora não pode sair à luz do sol porque não sente o calor a queimar-lhe a pele faz meses. E sabes disso.
Depois de eu desaparecer, começaste a pensar nas horas, nos dias e nos meses que passaste a meu lado e nas quantas vezes que erraste. E aí, apercebeste-te que o malfeitor foste tu. Mesmo assim, não vale a pena continuares a passar aqui. Para quê? As tuas lágrimas não servem nem para água de autoclismo, o teu suor apenas serve para te avisar de que precisas de um bom banho. E o teu coração, que começou a funcionar faz pouco tempo atrás, ainda é uma criancinha. E por isso ainda não sabe o que é realmente a dor. E disso, não me falta.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

brother

Às vezes tenho a certeza de que se estivesses a poucos metros de distância todos os dias, a minha vida seria mais fácil. As nossas vidas seriam mais fáceis. Tu és o meu porto de abrigo, a almofada onde descanso a cabeça quando tenho a minha alma a derreter-me nas mãos, a força a que me agarro, o cavaleiro por quem sempre espero no baloiço do meu jardim, o príncipe encantado que anda a dar voltas ao mundo à minha procura, o tudo que me preenche o órgão fraco e cansado que tenho do lado esquerdo do peito.
Em muitos momentos da minha vida só me apetece parar, ajoelhar-me, e gritar para os céus o quanto a injustiça é grande no mundo cá de baixo. Mas apesar disso, eu sei que não nos vamos separar. E, apesar de já o ter escrito milhões de vezes, sei que não o preciso de dizer tantas vezes quanto isso para ter a certeza de que é a mais pura das verdades. Dentro dos nossos corações, estamos sempre unidos, sempre em sintonia, como se fossemos as cordas de um mesmo violino numa única canção.

A afeição que temos um pelo outro é tão mas tão grande que eu sei que nunca vais deixar que me magoem. Tal como eu dava e dou o mundo por ti, sei que farias o mesmo por mim. E é por isso que te considero meu irmão. És o único, o de sempre e para sempre. E nem o oceano atlântico é capaz de desfazer o nosso laço. Nunca.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

aqueles dias

Depois, há aqueles dias em que nos apetece sair de cá, ir para outro mundo, viajar por outros troços, percorrer outros caminhos... Dias em que nos apetece até ser raptados por alguém por motivos não desonrosos mas apenas para nos ensinar o que é viver no desconhecido.
Hoje, por exemplo, podias-me levar para tua casa e deixar-me ficar lá em cativeiro por uns tempos. Podias abraçar-me por horas eternas e falar comigo a toda hora. Sei lá, não vos apetece também a vocês às vezes desaparecer? Mudar de ares não apenas para espairecer mas para nos esquecermos de uma outra vida e fazê-la num pequeno botão no meio do armário da roupa inteiro? Para parecer um nada que já lá vai, o tal botão num casaco que usava quando tinha 10 anos e que agora já nem me lembro da sua existência.
Se me ouves, se sentes isto que tenho no meu coração, pega na minha mão, puxa-me pelo braço, pega-me ao colo, às cavalitas, e faz-me esvoaçar para fora daqui.
Um dia começo a fartar-me da vida neste local. Parece muito aconchegante, onde tudo é lindo e maravilhoso, mas a rotina torna-se chata e desgasta o nosso interior. E é por isso que adoro mudar de locais por meros dias, ir para sítios diferentes onde ninguém sabe quem somos e onde, mesmo ninguém sabendo o meu nome, me sinto a rainha desse mundo fora. Uma rainha desconhecida, será isso possível?
Agora, começo a embrulhar-me demasiado com todo este paleio que não interessa a ninguém. Tirem-me daqui. Preciso disso.

Peço imensa desculpa aos meus seguidores por ultimamente não ter escrito nada de novo aqui no blog, mas além de não ter paciência para tal, tenho uma querida amiga aqui comigo a passar as férias da páscoa. Fiquem bem!

sexta-feira, 8 de abril de 2011

a máscara da felicidade deixa-nos cegos

Há dias em que nos sentimos os reis do mundo, sentindo a altivez momentânea a evaporar pelos poros. Sabemos que deixamos um perfume de importância por todas as ruas em que passemos e que, sem excepção, toda a gente sabe quem somos, o que fazemos, do que gostamos e o que ambicionamos; mas há também outros dias em que achamos ser os mendigos que vemos à porta do mercado, onde estão faça chuva ou faça sol, de mão erguida, por vezes com um quadrado de papelão mentiroso a arranjar motivo para que lhes larguem um centavo de caridade na palma. Achamos que qualquer que seja a meteorologia local, o nosso estado espírito está em baixo mas que, se alguém com um doce coração nos dá um sorriso, o sol começa a brilhar mais forte e a alma renova-se, qual rolo de papel higiénico quando acaba e alguém se dá ao trabalho de o trocar.
Há dias em que qualquer pontapé que nos dêem, por mais mísero que seja, é tão forte que é capaz de nos fazer perder a estabilidade e atirar-nos ao precipício. Uma palavra no momento errado, um olhar mal encarado, um suspiro nos intervalos de confissões são outras tantas coisas que, em dias como este, são mal interpretados e podem levar qualquer âmago à ruína, se nos tocar bem lá no fundo e de forma a provocar tal destruição, que ela se alastra pelo resto do corpo.
De quando em quando, faz bem sentirmo-nos assim: para nos apercebermos de possíveis erros que, quando tínhamos a máscara da felicidade estampada no rosto, não conseguíamos detectar, para darmos valor ao que naquele momento não temos nem podermos ter, entre outras coisas.
Mas não nos parece um futuro tão bom aquele em que nos vemos a saltitar com um sorriso de orelha a orelha e a espalhar alegria como se fossem pózinhos mágicos? Só que o grande problema, o que tanto deve dar dores cabeça aos filósofos, é que os que estão sempre felizes vivem num mundo à parte. Há que sublinhar que o nosso mundo não é - de todo - feito de arco-íris e flores à mistura, não é só doces sabores e sons bonitos. É feito de injustiças e dos que fazem que não vêem, dos que deixam passar ao lado e não se importam porque o que é mau não lhes toca na pele. E é por isso que existem os tais momentos em que nos sentimos os mendigos da praça, os zés-ninguém sem vida e sem destino.

domingo, 3 de abril de 2011

Just another lonely Sunday.

Sentada em frente à lareira passei a tarde de Domingo. Não li, não escrevi, nem sequer pensei. Sabem aqueles momentos em que nos sentamos em frente ao fogo e nos deixamos hipnotizar por ele como se nos pusessem um relógio a andar para a direita e para esquerda, direita e esquerda, direita e esquerda, até descolarmos os pés da Terra e viajarmos para outro mundo?
Sempre que tento fazer alguma coisa de útil como trabalhar o cérebro enquanto aqueço os pés, as contas saem-me ao contrário. Começo a vangloriar aquelas chamas qual Homo Sapiens quando o descobre e abstraio daqui. Não sei se penso, não sei o que vejo. Mas sei que saio de onde estou e vou para um sítio longínquo e normalmente demoro a aterrar novamente de pés bem assentes e em terra firme. Às vezes, quando tento voltar à vida, um furacão qualquer volta a mandar-me para o espaço e desperdiço (ou não) mais uns breves minutos da minha talvez breve vida para descansar o órgão pensador.
Ultimamente, ter isto como passatempo faz-me bem. Esquecer-me de mim própria e do meu dia-a-dia rejuvenesce-me a alma e o palpitar do coração. Por mim, faria isto a qualquer hora, mesmo em momentos inoportunos - que, às vezes, são os mais apetecíveis para tal.
E é só mais um Domingo sombrio, sozinho, cheio de espaços vazios e demasiadas vírgulas.
Mas a escolha de ele ser assim, foi minha.