quarta-feira, 28 de abril de 2010

when we can't escape..


consigo ouvir os teus passos atrás de mim, e já sei o que vai acontecer a seguir...

muito devagar, vais tapar-me a boca com um pano encharcado de álcool, e eu vou tentar resistir, vou tentar gritar, mas a minha voz vai sumir-se. vou adormecer, caída nos teus braços, e quando acordar verei quatro paredes brancas à minha volta. não vou estar amarrada, mas não vou ver nenhuma porta. não há saída, mas também não há entrada. vais-me aparecer pelas costas, com uma faca afiada na mão, e eu não vou sentir mais nada. como se tivesse desmaiado, ou como se me tivessem dado uma injecção qualquer para não sentir dor.
desta vez, não acordo.
mas consigo ter os meus pensamentos na mesma, como se ainda vivesse. e sinto.
sinto uma corda atada ao pescoço, sinto-me sem ar. tento mexer qualquer um dos meus músculos, mas sinto-os todos presos. tento gritar para que alguém me ouça, mas nem sequer consigo falar. tento abrir os olhos que se calhar já nem tenho, mas já nada me obedece. não sinto as pontas dos pés. não sinto as minhas mãos. tento tocar-me, mas é impossível. neste momento, que sei que já não há a fazer, suplico para comigo, e para quem me possa ouvir - quem me tirou da vida.
- tirem-me daqui. levem-me de volta para o mundo. deixei coisas por fazer. palavras por dizer. desculpas por pedir. promessas por cumprir. carinhos por dar. e principalmente, deixei-o. LEVA-ME JÁ DE VOLTA PARA ONDE ESTAVA! LEVA-ME! o meu mais que tudo não pode ficar sozinho, não. porque eu sei que se não estiver lá, ele quererá vir ter comigo. e eu não quero que ele se desperdice por quem nem sequer merece uma lágrima. leva-me para lá, ou então conta-lhe o que me fizeste, porque mo fizeste. isto é, se tiveres motivos.
dizes-lhe que o amo perdidamente? dizes-lhe para pensar sempre em nós, até nos piores momentos? diz-lhe também que nunca o deixarei, nunca na minha vida (eterna). diz-lhe todas as vezes que achares necessárias que o amo, diz-lhe. e não te esqueças de referir que foste tu que me tiraste dele. é que é sempre nos melhores momentos que algo de mau nos arranca da vida. e tu és o algo de mau. odeio-te por me tirares da pessoa que mais amo.

um dia, quando me levarem para longe, quero-te levar comigo. não no pensamento, mas na minha mão.
porque sabes? eu não sei viver sem ti. tenho a firme certeza de que sem ti,
não vou a lado nenhum.
e quando me for embora (para sempre)
vou sempre preocupar-me com o teu bem-estar.
acima de tudo.


terça-feira, 20 de abril de 2010

bang bang, it's death time

lentamente, sinto as pestanas caírem
uma por uma
mas as lágrimas ficam presas nos olhos
como se o choro fosse imortal.

sinto todas as armas apontadas para mim. em algumas, sinto-lhes o roçar das balas no cano. ouço dedos roçar no gatilho, com sede de mim. não tenho medo, sequer. é o momento? ou devo apenas tirar as mãos da cabeça e simplesmente deixar fazerem de mim o que querem? cada olho cor de natureza para o esgoto, o braço direito para um lado, a perna para o outro, e o tronco para o mar. até parece que já sinto tudo como se estivesse a acontecer agora: o óleo que já serviu para fritar as batatas para o almoço a corroer-me a retina; o braço e a perna a serem comidos, célula a célula, por pequenos moscardos; as minhas costas e a minha barriga, que em tempos me deram mais que dores a serem roídos pelos peixes e logo a seguir a sentirem os dentes de um enorme e sedento tubarão.
sei exactamente qual será o destino de cada bala. a da mulher que empunha a arma mais velha é directa na minha cabeça: vou esquecer cada memória, uma por uma, como se estivesse a adormecer e não soubesse sequer em que estava a pensar quando isso aconteceu. a do homem com as calças remendadas no joelho vai para o meu pescoço, para me fazer sentir a dor onde ela arde mais - na garganta, as cordas vocais desafinam, lentamente e profundamente, e por fim desaparecem. a do idoso com corcunda vai para o meu coração: para a morte não ser tão lenta, mas ser mais sentida e reflectida. e, finalmente, a rapariga com olhos tristes, que olha fixamente para a minha barriga, por onde já passaram almoços e jantares de todos os tipos - de vegetarianos e comida de plástico -, e por onde a esta hora ainda deve estar metade de uma maçã.
será que neste momento todas elas já estão lá, e eu já não estou cá? será o momento certo para dizer «estou a morrer»? está tudo desfocado. será esta a última imagem que terei do que é a vida? quatro corpos deformados e a olharem para mim, como se fosse simplesmente uma presa a abater, nada mais. nunca pensei que o fim fosse assim. tão vindo do nada. sempre me imaginei a morrer atropelada, ou por uma doença que me corroesse todo o corpo por dentro. mas, por ódio? duma forma tão... repentina? como se eu não fosse sequer humana? a vida tem muito que se lhe diga.
para estarmos completamente prontos para viver precisamos de 9 meses. mas para morrer, é relativo. tanto podemos morrer em 5 segundos, como em 5 anos. sabem o que somos? nada.

sábado, 10 de abril de 2010

dezanove


porque é que por vezes o peso da nossa cabeça triplica? porque é que a nossa consciência é que por vezes faz o nosso peso? os motivos: um pequeno pedaço nós vai-se, e nós achamos que não vamos sentir falta dele, que a dor é passageira, mas quando menos esperamos descobrimos que esse pedaço - aparentemente insignificante - é a nossa essência. talvez a palavra certa para esse pedaço de nós seja o motor, como nos carros. sem esse pedaço não somos nada, e desatamos para aí a despedaçar os outros em bocados cada vez mais pequenos. desmembramos laços, sonhos, olhares, sentimentos. desmembramos uma só pessoa em pó. desfazemos tudo, apenas com a nossa dor. a nossa consciência tem sempre motivos para pesar. e esses motivos levam-nos a outros motivos.
e quando a pessoa que mais amamos vai embora? e quando o porquê dela se ter ido embora foi nós próprios nos termos ido embora da vida de outra pessoa? a falta de nós provocou o distúrbio total.
e quando queremos ser alguém acima de todos os outros, como se mandássemos, e isso acaba também por provocar o tal distúrbio? ser outro dos motivos? minimizar os outros, fazê-los sentir inferiores. calca-los. espezinhá-los. deitá-los abaixo.
porque quando achamos que o nosso futuro está mais que programado - vamos apodrecer no meio de quatro paredes - talvez isso nem seja assim. talvez as causas nos ilibem do que achamos ser o nosso fim, a colisão de todos os sentimentos com os acontecimentos.
quando achamos que com um simples acto a tortura se vai, o simples acto torna-a permanente.
como uma cicatriz.
a dor leva à dor. e os nosso actos podem mudar tudo.
em 19 minutos podemos parar o mundo.

(Dezanove Minutos - Jodi Picoult. ACONSELHO!)

sexta-feira, 2 de abril de 2010

we have to die one day


talvez seja de mim, não sei
talvez desta vez eu saiba amar, não sei
talvez seja de ti? nobre desconhecido
talvez seja só por agora, não sei
talvez seja pela ausência, não sei
talvez seja realmente apenas por ser eu.

estás por aí ou apenas não me queres ouvir? estás presente ou queres apenas dar-te como ausente?
mas afinal, porque é que quando estamos às portas da morte nos entubam pelo nariz, pela boca, por tudo quanto é canto? porque é que apenas não nos deixam ir? voar para o infinito, para o desconhecido, para longe. porquê toda esta dor? matam-nos ao tentar trazer-nos à vida. amam-nos sabendo que estamos vivos. mas para lá do horizonte, não será melhor? mais aconchegante e seguro? aqui vemos as lágrimas e dor que trazemos aos outros pela nossa própria dor. e quando não podemos falar? como explicar que apenas não queremos estar aqui? que sabemos que lá, longe, no alto, estamos melhores? confiamos Nele, não é verdade? todos sabemos que ele estará lá, de mão aberta para nós, para nos levar para a felicidade depois do adeus a quem mais amamos. porquê tanto medo se daqui a milénios estaremos todos novamente em roda, unidos, de mãos dadas e a cantar o hino da alegria? podemos não ter a certeza do que nos espera, mas mesmo não havendo uma promessa de que estaremos todos juntos... sabemos que estaremos melhor do que estamos agora. sufocados pela dor que não nos deixa falar. pela perda das memórias que já não nos fazem trazer aos olhos os melhores momentos da nossa vida. simplesmente porque os anos passam, não ficam. vão todos, um por um, acabando por ser impossível conta-los pelos dedos das mãos e dos pés. e quando chegamos aqui, a esta etapa da vida, apenas o sorriso dos próximos nos faz sentir seguros, como se eles nos indicassem que ficaria tudo bem, mais tarde ou mais cedo. porque nós não ficamos aqui para sempre. um dia havemos todos de ver uma corda descer à nossa frente e com um brilho enorme que nos faz saber que ela nos diz "sobe, vem comigo, confia em mim" e por fim vemos a luz. aquela luz ofuscante por quem todos esperam, e alguns desesperam. a luz da eternidade, não sei. a luz da felicidade, não sei. mas é a luz. a de que todos falam.

(apenas falo por quem não consegue falar)