quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

le passé n'est pas passé

ando perdida, sem mapa, sem mochila e sem gps. não vejo sinais de vida. as casas estão vazias, as camas estão vazias, os carros estão vazios, os talheres ficaram por lavar, a roupa por secar, a pasta de dentes ficou na escova que agora se encontra caída no meio do chão. vejo um papagaio amarrado a um poste, completamente abandonado, um tacho de arroz completamente carbonizado, uma televisão ligada no canal do futebol, uma banheira cheia de água já fria, portas abertas, janelas abertas, tapetes a voar com o vento, mangueiras ligadas, rádios ligados. onde estão todos? quando finalmente volto, todos vão embora? será que o vento veio dar a má-nova da minha chegada e os levou consigo? ou sentiram o meu cheiro à distância? parecem ter todos fugido como se não tivessem outra hipótese, e sem levar nada, absolutamente nada. para onde foram? simplesmente... desapareceram? extinguiram-se? terão-se atirado da montanha? ou ao mar? será tudo isto uma manobra para eu me ir embora e todos voltarem?
dirigo-me à minha antiga casa, e encontro tudo aberto, como em todas as outras. o meu quarto está intacto, e consegue-se notar a imensa camada de pó em cima da cabeceira. há quanto tempo não entrariam aqui? se calhar simplesmente deixei de existir e nem me apercebi. admira-me não terem sequer trancado o meu quarto para não me relembrar. dentro da gaveta ainda permanece uma revista de à uns anos atrás, completamente desactualizada. por baixo dela está uma página rasgada, que suponho ser do meu antigo diário, pelas miniaturas de corações à sua volta.
"olá, querido diário. hoje conheci a minha alma gémea. não sei como nem porquê. já não me lembro que horas eram, se era de manhã ou de tarde, que casaco tinha vestido ou se sequer pestanejei. só sei que o vi no fundo da rua e que os olhos dele hipnotizaram-me por completo. todos os fios que me prendiam à vida partiram-se, e eu fiquei completamente à toa. no lugar dos fios surgiram cordas, ou talvez grades, não sei. agora tinha encontrado o centro da minha vida, ali, vindo do nada. não sei o seu nome, de onde vem, que idade tem, do que gosta, ou porque está aqui. só sei que o amo mais do que a mim, mas nem isso consigo entender. foi completamente involuntário. não falo sequer em amor à primeira vista, porque nessas coisas não acredito. ou poderei chamar a isto amor à primeira vista? mas isso é completamente vago, sabes? acho que lhe posso chamar o início de uma grande paixão, de uma perdição por um desconhecido que me pode levar a acreditar no amor. quer dizer, eu agora acredito nele, porque todas estas coisas que sinto só podem ser isso. o coração bate mais depressa, sinto o sangue a passar nas veias como se fosse um comboio e não paro de tremer. só penso naqueles olhos cor de mel e no que eles me diziam mesmo estando calados."
lembro-me tão bem de ter escrito isto. lembro-me como se tivesse sido ontem. nos dias seguintes a minha ansiedade não parou até que falei com ele e que a minha perdição pelo desconhecido se tornou recíproca. eu não sabia o que fazia, agora que penso bem. entreguei-me a esse tal de corpo e alma como se não tivesse que pensar em mais ninguém e dei-lhe tudo de mim. o poder sobre as minhas entranhas e coração, a minha capacidade de movimento, os meus batimentos cardíacos, o meu raciocínio, e principalmente, a minha vida. mas agora, fui-me embora e já não existe nada. absolutamente nada.


às vezes ainda tenho esperanças de te ver no fundo das escadas de braços abertos para mim. sim, tenho mesmo.
não é que sejam realmente esperanças, pois sei que não voltas. é mais uma enorme vontade de voltar a cruzar o meu olhar com esse teu olhar quente. ultimamente tenho o coração gelado, e preciso de o sentir quente. volta. estejas onde estiveres.

5 comentários:

  1. Amei..
    fiquei de boca aberta :o
    ta lindo, superas

    Beijinho <3

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  2. PRINCESA, então? arrepiei-me aqui com este texto. amo-te

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  3. sabes que mais? vai-se indo.
    sabes que quando se mexe no coração, há sempre pequenas marcas que insistem em ficar. amo-te e conta comigo, contas? eu continuo aqui

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  4. estou contigo para o que precisares. sempre. sempre mesmo :)

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