terça-feira, 24 de novembro de 2009

existência


Gostava que pudesses morar ao meu lado sem saberes da minha existência. Poder ver da janela do meu quarto a luz do teu desligar-se, e assim saber que ias dormir, que ias partir para outro mundo por umas horas. Podia acompanhar-te. Podia todas as manhãs ver-te sentado à varanda a olhar o sol – os teus olhos brilhavam sempre, brilhavam muito -ver-te cortar a relva, ver-te andar de bicicleta a dar voltas e voltas num mesmo círculo. Podia saber quando saías, quando voltavas, quanto tempo demoravas. Podia ver onde estavas de vez em quando, tudo apenas da janela do meu quarto. Apenas saber como era a tua vida me bastava. Não fazer parte dela? Importava-me, mas nunca tinha havido oportunidade de me encaixar na tua rotina, passo o dia a olhar pela janela para saber onde andas, como estás. Às vezes vejo-te chorar, não sei porquê, mas sei que te dói muito o coração. Sei que és lindo por dentro sem nunca ter falado contigo, sei quando estás feliz, sei quando estás angustiado. Conheço-te melhor do que ninguém, e tu não o sabes. Sabes que vive uma menina na casa da frente mas não sabes como se chama, não sabes de que família é, não sabes a sua idade, não sabes nada de nada sobre ela. À uns dias que te vejo rondar o meu lar, parece que a curiosidade despertou em ti, pois nunca vês ninguém cá fora, mas sabes que vive aqui gente. Vês o meu pai a ir buscar o pão, vês a minha mãe sair para fazer compras, mas nunca me vês no jardim. Nunca me olhaste. Sou só, estou sempre no meu quarto – o meu refúgio. E tu estás assim, a tentar encontrar-me, sem eu poder mostrar-me. Escondo-me também, não quero nunca que me vejas, gosto do mistério. Sei que se algum dia me vires eu serei invisível aos teus olhos, pois os teus olhos apenas vêm a pureza, e eu já cometi erros inexplicáveis, e o que tu tanto queres ver, nunca verás. Podia até sair de casa e mostrar-me bem à tua frente que não me verias. Eu queria e quero, porque te amo em silêncio, mas as minhas palavras são silenciadas pelo som do erro e a minha respiração ao lado do teu pescoço seria abafada pelas correntes que nos separam. Podia segurar-te na mão com todas as forças que pudesse, mas tu não sentirias. Um dia estava à janela a olhar-te a rondar a minha casa, olhaste para mim, mas eu sabia que não me vias, mas mesmo assim… continuaste a olhar. Foste bater à porta, chamaste por alguém da casa, mas ninguém te abriu a porta. Algo mudou, podias-me ver, mas eu não queria entrar na tua vida, apesar de já o ter feito sem intenção, por mero acaso. Mas não te queria fazer sofrer, por isso não me verás mais, não saberás mais nada de mim. Vou-me esconder dos teus olhos e afundar-me no meu mar de medos e receios. Embrulhar-me-ei em lençóis de infelicidade e fechar-me-ei entre correntes do desespero. Parte de mim deseja que me vejas, mas a outra parte sabe bem que não podes. Por isso nunca mais colocarás os teus olhos sobre a minha pele, pois a tua segurança e felicidade dependem de mim, e das minhas escolhas em relação a entrar na tua vida por vontade própria. Escrevia-te uma carta, mas assim saberias que queria contactar-te. Portanto, adeus, fechei-me como uma concha e atirei-me para o fundo do mar. antigo*
(estou mesmo feliz. acho que não há noção alguma para o que sinto. parece que me livrei de todos aqueles males que teimavam em dar-me as mãos, parece que todos os meus pontos fracos agora tornaram-se em algo distante, parece que os meus pequeninos erros se tornaram num zero, num nada. acho que nem consigo explicar a felicidade que sinto, não consigo. senti-me tão bem.)

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