Ela tentava fugir àquilo que sentia,
mas de cada vez que parava pelo caminho para descansar e respirar fundo, o
sentimento assolava-a como um trovão: deixava cada pêlo eriçado, o coração a
palpitar freneticamente, as entranhas a contorcerem-se e os pensamentos a mil. Quando
isso acontecia, ela voltava a correr como se a sua vida disso dependesse, de
maneira que todas essas sensações eram deixadas para trás, apesar de ela ter a
certeza que, da próxima vez que voltasse a parar, elas iriam apanha-la. Esta
era uma corrida na qual ela não tinha qualquer hipótese de vencer. Era inevitável.
O seu principal objetivo era, simplesmente, fugir para o mais longe que pudesse
daquele sítio, daquele espaço no meio da terra, do perímetro no meio de um
mundo tão grande. Tinha esperança que, a quanta mais distância estivesse de lá,
menos os sentimentos a abalariam, e talvez conseguisse sobreviver. Nunca foi
muito boa com sentimentos até ter que os encarar realmente de frente.
De cabelos ao longo do corpo com uns
jeitos emaranhados atrás das orelhas, pele cor de névoa e olhos de infinito,
estava ela ali sentada. Não sabia o que a esperava e muito menos quem a
esperava. Nunca estamos preparados para
nada até termos que lidar com a realidade. Olhava para o além, e pensava em
alguém. Alguém esse que, ultimamente, decidira tanto lhe oferecer um cravo,
como lhe dar uma ferradura; era incompreensível para a maioria do mundo, mas
totalmente compreensível para ela. Conheciam-se e ela, no meio de tanta
incerteza que lhe toldava o pedaço de alma que lhe pertencia, tinha tanta
certeza. Passava o tempo a imaginar o possível e o impossível, a escrever
histórias na sua mente que faziam o coração remoer-se de desejo, e a pensar, ao
mesmo tempo, que devia apagar tudo aquilo do seu pensamento – tinha por hábito
considerar que se pensasse muito em algo bom, isso nunca iria acontecer. Era um
karma estranho. Mas era também
inevitável. E ela sabia-o.
Com o seu jeito tão característico e
caminhar orgulhoso, ele aproximou-se. Tinha noção que fazia parte dos seus
sonhos faz tempo e, lá no fundo, apesar de não lhe contar, também sonhava com
ela. Constantemente. Mas teimava em deixa-lo escondido, com medo de a perder,
com medo de se perder. Avistou-a logo que sentiu o seu perfume, e foi-se
aproximando. Nenhum dos dois sabia o que ali ia acontecer. Ele caminhava, com
um nervoso miudinho a bater-lhe no peito, mas com um rosto impenetrável. Ela,
sentada, no seu mundo, não se apercebia da sua presença, ainda que se sentisse
constantemente ligada a ele. Passo. Passo. Passo.
Sentiu alguém tocar no seu ombro.
Olhou para trás.
Foguetes. Estrelas. Música.
Borboletas. Tudo. Nada.
É difícil ser esbofeteada por
tamanha força de sentimentos, quando não se sabe muito bem como lidar com eles.
Em pensamento, tentava fugir. Fisicamente, ficou.
Sempre.
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